20 de mar. de 2014

O amor em três atos


Ato 1 As louças do armário

Hoje eu queria poder te ver
E escolher, por uma noite, os caminhos que deveríamos seguir

Hoje eu queria poder te contar uma piada e ficar deitada no seu colo
Inventando os carinhos que você não me faria
Sentido os gostos dos beijos que você não me daria

Eu poderia aparecer na sua casa
e cumprimentar seu porteiro e subir o elevador
treinando meu sorriso no espelho.

E poderia entrar na sua casa te abraçando
Contando meus planos
Desvendando nossos abismos

Só por esta noite você poderia me amar
Eu poderia brincar de ser sua
Você poderia me pedir pra ficar.

2 A moça que passa

Eu assisto a cidade através das janelas engorduradas do ônibus.
Eu ouço minha própria voz pelo fone de ouvido.

O asfalto transpira meu suor.
Na fachada no prédio da frente: Maria Cecília.
A moça apressada equilibra-se no meio-fio.

Eu vi alguém se jogando na linha do trem.
Eu vi o rapaz com taco de beisebol na livraria.
Eu vi a cidade vazia.

Havia uma minhoca morta na calçada.
Uma Maria Fedida na janela do 14º andar
A borboleta amarela.

Eu vi minha cara refletida no espelho da loja. Eu vi sua saudade escancarada nos meus olhos, se abrindo em flor.

3 No final daquele verão

Acalmo o coração
Passo fino, calo as palavras

Caminho sozinha pelo centro.
Seco os cabelos ao vento. Esqueço os brincos em casa.

Acendo incensos ao mesmo tempo.
Não como carne. Não passo rímel.

Tenho preguiça às terças-feiras.
Acordo às 7h no fim de semana.

Ouço a mesma música todos os dias.
Leio revistas diferentes todas as tardes.

Mudei a energia da casa.
Troquei a cama de lugar. Os lençóis, as gavetas, os gestos.

Sigo pela cidade como estrangeira, pelos metrôs e seus espaços. Pelas ruas e seus vazios.
Sigo cantando meu amor, a viagem já começou.

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