27 de mar. de 2014

A solidão em três atos


La chanson que tu aimais

Ele saiu pela porta que entrou.
Eu permaneci na mesma pausa, tocando a mesma nota, decifrando a mesma sílaba.

Os dias são espelhos.

Eu que te procurava por cima das flores do mercado, atrás da cesta de pães.
Minha mão pálida, o sorriso estrelado,
imóvel,
desenhado.

Eu que fugia da tua imagem fragmentada.
todos os dias, das noites.
E nas noites, dos dias.
Da tua rua.
Da tua história.
Do nosso amor dizimado.

Te procurando nos mesmos velhos hábitos, a calca de pijama surrada, as canecas de chá, as noites de domingo.

sopro.
eu nunca mais te vi.

meu bem,
não lembro mais o que perdi.

La mer d’hiver

os sonhos que não divido
os que eu não ouso te contar
as palavras que me faltam,

[como naquele dia]

parei bem naquela fase que antecede a paixão
antes daquela angústia que a gente encerra no outro
Parei bem aqui.

E fiquei esperando você vir me socorrer.
Cheio daquelas vozes que definem tesão
as entregas todas, entende?

Pisei meu pé em cima do teu muro
Com o nariz bem no meio do teu peito
Como vertigem
Como um sonho que eu nem sabia como sonhar

Não quero mais macumba esotérica
pra me impedir de encontrar você um dia.

Se não for algum tipo de peça do universo
Quem tá aqui, fazendo de conta de clown, nesse circo que virou cenário de vida?

Le jardin

então, amar só pela entrega
dizer o que não se espera

o outro à espreita:
da minha verdade
a minha saudade, a minha perdição

eu, que não carrego certezas
                                 [ainda assim você me desejaria?]

se eu não fosse embora, se estivesse disponível
se fizesse promessas indizíveis

diga, você ficaria aqui,
                        [ainda que eu te amasse?]

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