De autor desconhecido
Então acontece uma
dessas coisas que só são possíveis quando você mora numa cidade de praia: você
não vai à praia.
Digo, você não vê o
mar, não se impressiona com a beleza, o ar puro, e todos aqueles clichês que
envolvem o sonho padrão de um paulistano medíocre: morar na praia.
Digo: você não.
Eu.
Muito prazer, paulistana medíocre, ao seu dispor.
Digo, eu que não nasci em São
Paulo e faço parte de mais um clichê que envolve a cidade: 18 anos, classe
média, que vem à capital cursar faculdade.
Sim. Morei numa kit, frequentei a
Augusta, trabalhei desde o primeiro ano da faculdade e, claro, bebia na
Paulista com caras com ternos mal cortados que trabalhavam em banco. Graças a
Deus não fiz cursinho na Liberdade. Dessa me livrei por pouco.
Soa um pouco pessimista, né?
Mas tudo isso me conduziu até
onde estou hoje. Vagando pela Europa sem dinheiro, sem moradia, bebendo uísques
vagabundos, fodendo com estrangeiros em hostels que
cheiram a naftalina.
Escrevo agora de
Londres, com uma garrafa de gim em uma lan
house de um vietnamita.
Uau.
Que fucking Bukowski eu
daria: escritora, bêbada, fumante, sem dinheiro e, absolutamente, genial.
E aí teríamos um
clichê que valesse a pena na minha vida.
Nada mais longe da
minha realidade.
Mas afinal, quem se
importa com a minha vida? Beijo, mãe.
Afinal, falar de si mesmo
na prosa é como fazer poesia sobre paixão. Rosas, estrelas, meu leito,
penso em ti.
Caralho, penso em ti?
É quase como
comemorar aniversário de namoro no motel, com lençol de seda dourado e
champanhe barato no balde com gelo.
....
(Quem-nunca?)
...
"Saio da vida
para entrar na história".
E agora tem até frase
pulando dentro da minha história.
É. Porque decidi: este
vai ser um texto surrealista.
Sou Mademoiselle
Duchamp, baby. Este texto agora é minha privada, que eu vou pendurar na parede
da sua sala. E você vai achar incrível, porque você me ama e ninguém mais
entende minha arte, o que fará de mim, aos seus olhos, a coisa mais exclusiva,
sexy e talentosa que você já comeu.
Oi, você ainda tá aí?
Sinto muito, isso tá
errado. Eu queria falar de praia, eu queria fazer uma poesia sobre o mar.
Eu queria fazer uma
coisa sexual, mas lírica ao mesmo tempo. Castro Alves meets Nelson Rodrigues
(ai, não ando nada modesta).
Sabe, já tava tudo na
minha cabeça desde ontem à tarde, quando me obriguei a parar na praia para
olhar o mar.
Isso, sentar e olhar
o mar, respirar-e-mar, sentir saudades-e-mar.
Pensei que na minha
poesia, a espuma era sua porra. E a gente podia/
Mentira, a coisa da
espuma-porra pensei agora.
E se pudesse
apagaria, porque relendo me soa de extremo mal gosto.
Claro, claro, baby. Poderia
apagar...não sou nenhuma retardada que não sabe desfazer as merdas que faz.
Digo, será possível,
de alguma maneira, apagar as coisas que fizemos na vida? Existe um backspace pra isso?
É muito fácil se
esconder atrás de uma poesia, de joguinhos de palavras, segura pela gramática, parágrafos-pontos-vírgulas-tremas
(eu uso tremas às vezes, soa tão sofisticado). Argumentos são lidos e relidos
antes de se publicar. Racionalizando amores, rimas, oferecendo a um leitor imaginário a ilusão que
você tinha absoluto controle do que dizia.
Escrever é para os
covardes, baby.
Dizer que te amo
exige muito mais do que uma página em branco.
Sobre a autora:
Faz ensaio sensual, já tem nome
artístico de ninfeta ninfomaníaca.
Um dia chega lá: rainha da bateria,
peitinho de fora, close de rosto inteiro no Jornal Nacional. Tá se guardando
pra quando o carnaval chegar.
Na capa da Playboy, nome e sobrenome
de família, ela promete. Sua hora da estrela.
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